A Sinagoga do Porto

Aqui fica uma visita guiada à Sinagoga Kadoorie Mekor Haim, do Porto. Com um agradecimento muito especial à comunidade judaica da cidade invicta, pela iniciativa de abrir ao mundo as portas virtuais da sua bela sinagoga. Shalom!

BARROS BASTO REINTEGRADO NO EXÉRCITO

Lisboa, 14 de Março de 2012.
O parlamento português declarou hoje, por unanimidade entre todos os partidos, que o capitão Barros Basto deve ser reintegrado no exército. A Comissão de Defesa Nacional considerou que o militar judeu foi punido por factos que se «relacionam diretamente com a prática regular da sua religião» e que o processo de que foi alvo «se traduz num processo de perseguição e discriminação religiosa».
O PSD e o CDS (que juntos, formam maioria, mas que gozam do apoio dos demais partidos) comprometeram-se a elaborar um projecto de Resolução com vista a reintegrar simbolicamente no exército o militar vítima de antissemitismo.
Há duas semanas, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (CACDLG) já havia procedido à reabilitação moral de Barros Basto, sublinhando que ele «foi separado do exército devido a um clima genérico de animosidade contra si motivado pelo facto de ser judeu, de não o encobrir, e, pelo contrário, de ostentar um proselitismo enérgico convertendo judeus portugueses marranos e seus descendentes”.
Esta decisão da CACDLG foi saudada pela Anti-Defamation League.

::A LER:: PARLAMENTO REINTEGRA BARROS BASTO NO EXÉRCITO / O resgate do capitão (um excelente texto de Miriam Assor) / Texto integral da decisão da Comissão de Defesa Nacional (clique em baixo):

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BARROS BASTO REABILITADO!

Capitão Barros Basto

Porto, 29 fev (Lusa) – A Liga Anti-Difamação (LAD) transmitiu a sua profunda satisfação pela reabilitação no Parlamento do capitão judeu Barros Basto, afastado do exército em 1937, apelando agora à sua reintegração póstuma em missiva à AR.

“Ficámos satisfeitos ao saber da votação favorável na Assembleia da República da petição No.63/XII/1, ‘Pedido de reintegração no Exército do capitão de Infantaria Arthur Carlos Barros Basto, que foi alvo de segregação político-religiosa no ano de 1937’”, refere a carta da Liga endereçada à Presidente da Assembleia, Assunção Esteves.

A petição, apresentada por Isabel Lopes, neta do capitão, a 31 de Outubro de 2011, tinha como fundamento “a violação grave de direitos humanos e a afectação intolerável do núcleo duro dos direitos fundamentais materialmente protegidos pela Constituição da República Portuguesa”, requerendo então a “intervenção da Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias”.

“Hoje, a comissão mais importante do parlamento declarou que a sentença de 1937 foi antissemita. Ou seja, Barros Basto não foi imoral; a decisão que o condenou é que foi imoral”, afirmou Isabel Lopes.

A história remonta a 1937 quando o Conselho Superior de Disciplina do Exército decidiu pela “separação do serviço” do capitão Arthur Carlos Barros Basto por considerar que não possuía “capacidade moral para prestígio da sua função e decoro da sua farda”.

Em causa estava a realização de operações de circuncisão a alunos do Instituto Teológico Israelitas do Porto, que havia fundado, e a saudação com um beijo dos mesmos alunos, à maneira dos judeus sefarditas de Marrocos.

Ao longo dos anos, Barros Basto tem sido comparado por historiadores ao general francês de origem judaica Alfred Dreyfus, que em 1894 foi injustamente condenado por alegada traição.

Depois da reabilitação pela primeira comissão, começa agora a luta pelo segundo objectivo de Isabel Lopes, a reintegração póstuma do capitão Barros Basto no exército, que será tratada pela comissão de Defesa Nacional.

Para Rui Silva Leal, o advogado que acompanhou o processo, “o Parlamento saberá agora retirar a consequência prática desta reabilitação do nome do senhor capitão” e se “a notícia de hoje é: ‘Barros Basto reabilitado’, em breve será ‘Barros Basto reintegrado’”.

Nesse sentido, a própria LAD manifesta a sua “profunda satisfação” para com a “decisão importante” hoje tomada e diz esperar agora pela “muito atrasada” reintegração do capitão.

::A LER:: Carta da ADL à Presidente da Assembleia da República (texto em inglês, formato pdf) / CM: O resgate do capitão (texto de Miriam Assor)/ PARLAMENTO REABILITA MILITAR JUDEU (JN) / ADL Welcomes Reinstatement of Captain Ousted from Portuguese Army Due to Anti-Semitism / Barros Basto reabilitado [artigo do diário israelita Haaretz, contendo uma pequena entrevista a Inácio Steinhardt, traduzido do hebraico para o português por Israel Levi] / Clique em baixo para ler o texto integral da decisão parlamentar:
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Petição para reabilitar capitão judeu aceite no Parlamento

Boas notícias que chegam de Lisboa:

Porto, 13 dez (Lusa) – A petição pela reabilitação póstuma do capitão judeu Barros Basto, afastado do exército em 1937, foi hoje admitida pela comissão parlamentar com a consonância de todos os partidos políticos.
O deputado João Rebelo, do CDS, ficou nomeado como relator tendo agora um prazo de três semanas para apresentar um relatório, a ser posteriormente votado em comissão, e propor as próximas ações.

A petição “tem como fundamento a violação grave de direitos humanos e a afetação intolerável do núcleo duro dos direitos fundamentais materialmente protegidos pela Constituição da República Portuguesa, pelo que se requer a intervenção da Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias”, começa por dizer o documento que chegou à Assembleia da República a 31 de outubro pela mão da neta do capitão.
O relator terá agora de consultar o processo de 1937, para confirmar que de facto foi proferida a sentença que condenou Barros Basto, e pedir um parecer à Comissão Parlamentar dos direitos, liberdades e garantias.

Sem querer adiantar mais pormenores, João Rebelo garantiu apenas que irá “marcar uma reunião com os peticionários”: a neta do capitão e o seu advogado.

Ao longo dos anos, Barros Basto tem sido comparado por historiadores ao general francês de origem judaica Alfred Dreyfus que em 1894 foi condenado, inocentemente, por alta traição.

A história remonta a 1937 quando o Conselho Superior de Disciplina do Exército decidiu pela “separação do serviço” do capitão Arthur Carlos Barros Basto por considerar que não possuía “capacidade moral para prestígio da sua função e decoro da sua farda”.

Em causa estava a realização de operações de circuncisão a alunos do Instituto Teológico Israelitas do Porto, que havia fundado, e a saudação com um beijo dos mesmos alunos, à maneira dos judeus sefarditas de Marrocos.

Nascido em 1887, Barros Basto, ou Ben-Rosh, apenas se converteu [retornou] ao judaísmo em 1920 por influência do avô e depois de regressar da I Guerra Mundial, lançando-se depois numa campanha para resgatar outros judeus marranos como ele (descendentes de judeus portugueses e espanhóis que foram obrigados a se converterem ao cristianismo pela imposição da Inquisição).

Parlamento discute reabilitação de Barros Basto

Capitão Barros Basto

A Assembleia da República Portuguesa vai discutir o caso do capitão Barros Basto hoje, terça-feira, dia 13 de Dezembro de 2011. Quase 75 anos após ter sido afastado da instituição militar que servira com distinção, no culminar de um processo kafkiano movido por um antissemitismo institucional que valeria equiparação ao tristemente célebre caso Dreyfus, o capitão poderá ser ainda hoje finalmente reabilitado a título póstumo (Artur Barros Basto faleceu em 1951).
O processo de reabilitação tem contado com o apoio de políticos de todos os quadrantes e também de personalidades ligadas à cultura. Na semana passada, o escritor luso-americano Richard Zimler escreveu sobre o processo no blogue britânico Harry’s Place, num post intitulado Remembering Artur Barros Basto. Uma entrevista de Richard Zimler à RTP, onde o escritor também fala do caso do capital Barros Basto, pode ser vista aqui:

::A LER & OUVIR:: Petição para reabilitar capitão judeu debatida no Parlamento / CM: Parlamento discute caso Barros Basto / TSF: A jornalista Alexandra Nunes conversou com a neta do capitão Barros Basto / Barros Basto: Escritor Richard Zimler lança apelo internacional pela reabilitação do capitão / É tempo de reabilitar o Dreyfus de Portugal / A cobardia dos costumes brandos: ainda a ditadura / Capitão Barros Basto / Daniela Ruah apela a mobilização por Barros Basto

Daniela Ruah apela a mobilização por Barros Basto

Daniela Ruah

A petição online da organização internacional Shavei Israel que apela à celeridade no processo de reabilitação do capitão Barros Basto ultrapassou as mil assinaturas, depois da actriz Daniela Ruah se ter identificado como sobrinha bisneta do capitão e de ter apelado à participação dos seus fãs.

“Só faltam algumas centenas de assinaturas. Este homem foi meu tio bisavô e acredito que esta petição é importante”, assim escreveu a actriz na sua conta no Twitter .

A petição online (Rehabilitate the late Jewish war hero Capt. Arthur Barros Basto) foi lançada a 14 de Novembro pela Shavei Israel (uma organização internacional sediada em Israel) pedindo celeridade no processo de reabilitação do capitão Barros Basto, vítima de antissemitismo institucional no seio das Forças Armadas Portuguesas, em 1937.

.::A LER::. Reportagem do Público sobre o caso do Capitão Barros Basto (PDF)/ O Dreyfus português (Um excelente artigo de Marinho Pinto, bastonário da Ordem dos Advogados).

Reabilitação do capitão Barros Basto IV

Capitão Barros Basto

A campanha de reabilitação do capitão Barros Basto alcançou já uma dimensão internacional, com referências ao processo feitas na norte-americana e europeia. Agora, Michael Freund, presidente da organização Shavei Israel, juntou a sua voz a este movimento crescente, apelando para que seja feita justiça à memória do capitão Barros Basto num artigo publicado esta semana no Jerusalem Post: Time to rehabilitate Portugal’s Dreyfus.
Simultaneamente, Freund apela aos seus leitores de todo o mundo que assinem uma petição online destinada a ser entregue à presidente da Assembleia da Republica. Os leitores da Rua da Judiaria podem ler e assinar a petição aqui: Rehabilitate the late Jewish war hero Capt. Arthur Barros Basto.

Reabilitação do capitão Barros Basto III

Capitão Barros Basto

O processo para a reabilitação do capitão Barros Basto, que recentemente chegou oficialmente à Assembleia da República, encontra-se cada vez mais próximo de fazer justiça à memória de uma das maiores figuras (senão mesmo a maior) do judaísmo português do século XX.
O Correio da Manhã dá conta dos últimos desenvolvimentos:

Reintegração
Negrão declara urgência no caso de judeu
Fernando Negrão, presidente da Comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, declarou urgente o caso da reabilitação do militar judeu Barros Basto, que foi alvo de segregação político-religiosa no ano de 1937. A petição, feita pela neta e patrocinada pelo advogado Rui Silva Leal, lembra que o oficial tinha sido «sancionado por ser judeu e praticante da religião judaica». Disse o Exército que Barros Basto não possuía «capacidade moral».

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Caso Barros Basto Chega ao Parlamento

Capitão Barros Basto

O pedido formal de reabilitação do capitão Barros Basto, popularizado como o “Dreyfus Português”, deu entrada na Assembleia da República a 31 de Outubro passado. redigido pelo advogado Rui da Silva Leal, o pedido tem como signatária Isabel Maria de Barros Teixeira da Silva Ferreira Lopes, neta do capitão Arthur Carlos Barros Basto. Eis o documento na integra:

Exm.ª Senhora
Presidente da Assembleia da República

Assunto: Pedido de reintegração no Exército do capitão de infantaria Arthur Carlos Barros Basto, que foi alvo de segregação político-religiosa no ano de 1937.

A presente petição tem como fundamento a violação grave de direitos humanos e a afectação intolerável do núcleo duro dos direitos fundamentais materialmente protegidos pela Constituição da República Portuguesa, pelo que se requer a intervenção da Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Tudo nos termos e pelas razões seguintes:

1. Numa época em que campeava o antissemitismo pela Europa e em que se preparava o encaminhamento de milhões de seres humanos como reses a caminho do matadouro, em Portugal, um oficial do Exército, Arthur Carlos Barros Basto, foi sancionado por ser judeu e praticante da religião judaica.

2. Com efeito, em 12 de Junho de 1937, no processo de natureza disciplinar n.º 6/1937, o Conselho Superior de Disciplina do Exército (um órgão próprio de um regime de poder pessoal) deu como provado que Arthur Carlos Barros Basto «realizava a operação da circuncisão a vários alunos [do Instituto Teológico Israelita do Porto] segundo um preceito da religião israelita que professa», e que «tomava para com os alunos atitudes de interesse e intimidade exageradas, beijando-os e acarinhando-os frequentemente» (à imagem dos judeus sefarditas de Tânger, onde o visado se converteu ao judaísmo) – cfr. Documento n.º 1

3. À luz destes factos provados, o Conselho Superior de Disciplina do Exército considerou que Arthur Carlos Barros Basto não possuía «capacidade moral» para prestígio da sua função e decoro da sua farda, pelo que o puniu com a «separação de serviço» prevista no artigo 178.º do Regulamento de Disciplina Militar, publicado pelo Decreto 16:963, de 15 de Junho de 1929.

4. A «separação de serviço» constituiu para Arthur Carlos Barros Basto (o oficial e o judeu) uma verdadeira pena de morte civil. O visado foi afastado definitivamente das suas funções; foi impedido definitivamente de progredir na carreira; foi proibido definitivamente de usar uniformes, distintivos e insígnias militares; e foi obrigado a manter-se para sempre subordinado à acção disciplinar do Exército (ou seja, foi forçado a manter a sua vida civil e a sua prática religiosa para sempre modeladas por regras militares absolutamente hostis aos preceitos judaicos mais elementares), sob pena de voltar a ser julgado, sob pena de voltar a ser condenado!

5. Os factos que o Conselho Superior de Disciplina do Exército considerou «provados» (e que determinaram a «incapacidade moral» e a consequente «separação do serviço» do militar judeu Arthur Carlos Barros Basto) enquadram-se a todas as luzes no exercício de direitos universalmente reconhecidos a todos os homens e que já existiam antes de haverem sido “proclamados”.

6. Acresce que a decisão do Conselho Superior de Disciplina do Exército – em tudo contrastante com a normação Dinim que promana da tradição primordial – impede quem quer que seja de entender como alcançaram os julgadores o grau de certeza que é suposto terem conseguido em relação aos factos que consideraram provados.
Trata-se de uma decisão que não tem uma linha de fundamentação, que não procede ao exame crítico dos meios de prova que foram considerados e desconsiderados, e que chega ao cúmulo de censurar Arthur Carlos Barros Basto por não ter espancado quem o denunciou.

7. O 25 de Abril pode ter reparado muitas injustiças do passado, mas pelo menos um homem ficou esquecido. Ficou esquecido Arthur Carlos Barros Basto. Ficou esquecido o judeu.
Lea Montero Azancot Barros Basto (viúva de Arthur Carlos Barros Basto) apresentou, no ano de 1975, um pedido de reintegração do falecido marido no Exército, mas obteve uma resposta negativa por parte do Estado-Maior General das Forças Armadas, que, a respeito da decisão de 1937, e de modo inacreditável, CONFUNDIU os factos «não provados por unanimidade» com os factos «provados», e anexou à ilegalidade anteriormente cometida outra mais escandalosa. – cfr. Documentos n.ºs 2 e 3

Nesta confluência,

Vem a signatária requerer à Assembleia da República que proceda à reintegração nas fileiras do Exército do senhor seu avô, Arthur Carlos Barros Basto, tendo por espeque norteador (muito para além do Decreto-Lei n.º 173/74, de 26 de Abril, aplicável ao caso por força do argumento a maiori, ad minus) o dever moral e imprescritível do Estado de reparar uma violação tão grave da Lei consuetudinária internacional. Adonai li velo irá.

Juntam: Procuração e três documentos

Isabel Maria de Barros Teixeira da Silva Ferreira Lopes
(neta de Arthur Carlos Barros Basto)

Rui da Silva Leal
(advogado)

Sobre o caso, é ainda imperdível este artigo de Marinho e Pinto – que tem lutado incansavelmente para a reabilitação do capitão Barros Basto, em conjunto com a Comunidade Israelita do Porto. A artigo foi publicado na edição de hoje (2 de Novembro de 2011) do Jornal de Notícias.

O Dreyfus português

Marinho e Pinto

Um dos actos mais chocantes de perseguição política e religiosa praticado pela ditadura do Estado Novo continua, 74 anos depois, a produzir os seus efeitos, uma vez que o Estado democrático ainda não corrigiu a injustiça. A vítima foi Artur Carlos de Barros Basto, um capitão do Exército português convertido ao judaísmo, que foi banido do Exército por praticar actos próprios desta religião. O caso é paradigmático por acção (do Estado Novo) e por omissão (do Estado democrático), uma vez que um pedido de reintegração formulado pela viúva do militar já depois do 25 de Abril foi rejeitado com base nas mesmas acusações que haviam fundamentado a injustiça.

Denunciado anonimamente por homossexualidade, Barros Basto foi totalmente ilibado em tribunal, mas o Exército, embora declarando também não provados os actos de homossexualidade, condenou-o, em Junho de 1937, por ter feito a circuncisão a vários alunos do Instituto Teológico Israelita do Porto (onde era professor) e por os cumprimentar com beijos nas faces como era normal entre os judeus sefarditas de Marrocos, onde Barros Basto se convertera ao judaísmo. Os militares acusaram-no, então, de não ter “a capacidade moral para prestígio da sua função oficial e decoro da sua farda” e aplicaram-lhe uma sanção que tem tanto de absurda como de degradante. Foi condenado na pena de “separação de serviço” que o afastou definitivamente do Exército, o privou das remunerações e respectivos benefícios sociais, o impediu de usar a farda, distintivos e insígnias militares, mas – pasme-se – manteve-o sujeito à disciplina militar, podendo a todo o momento voltar a ser julgado e condenado por qualquer facto que os militares julgassem incompatível com o “prestígio da função” (que já não exercia) ou ofensivo do “decoro da farda” (que já não vestia).

Contudo, o verdadeiro “crime” do capitão Barros Basto foi, de facto, o trabalho de “resgate” dos marranos, ou seja, dos descendentes dos judeus convertidos à força para escapar à expulsão decretada pelo rei português D. Manuel, em 1496, e às perseguições que se lhe seguiram, principalmente pela Inquisição. A maioria desses “convertidos”, também chamados “cristãos-novos”, manteve-se fiel às suas crenças e continuou a praticar secretamente os actos de culto do judaísmo. Barros Basto, o “apóstolo dos marranos” como foi designado, percorreu o país, identificando os descendentes clandestinos desses cripto-judeus, trazendo-os à luz do dia e fazendo com que eles não se sentissem civicamente diminuídos por professar a religião em que acreditavam. Foi um ousado trabalho de recuperação da dignidade de uma religião cruelmente perseguida durante séculos, mas sobretudo um audacioso combate ao medo e até à vergonha de a praticar em público. Na verdade, uma das facetas mais hedionda da perseguição aos judeus em Portugal foi a conversão forçada daqueles que, por falta de recursos, não puderam acatar a ordem de expulsão e abandonar o país. Muitos deles acabariam queimados nas fogueiras da Inquisição ou então linchados por turbas fanatizadas como aconteceu em Lisboa, em 1506, em frente da Igreja de São Domingos, onde milhares de judeus foram assassinados.

Ora, numa época em que (mais) uma onda de anti-semitismo varria a Europa e que iria conduzir ao holocausto nazi, a acção de Barros Basto não podia ser tolerada por um regime de características fascistas e germanófilas, cujas instituições mais representativas estavam, também elas, imbuídas de um milenar anti-semitismo e marcadas por séculos de intolerância religiosa e de perseguição aos judeus. Comparado a Alfred Dreyfus, por uns, ou a Aristides Sousa Mendes, por outros, Artur Barros Basto continua, porém, ao contrário desses, com a memória manchada por uma condenação infamante – talvez porque nunca houve em Portugal um Émile Zola que acusasse publicamente os seus acusadores.

E, assim, estranhamente, 37 anos depois do 25 de Abril, ainda ninguém teve a coragem de reparar a injustiça feita a um oficial do exército português, convertido à religião judaica, condecorado por actos de bravura durante a I Grande Guerra e que, em 1910, hasteara a bandeira da República na Câmara Municipal do Porto. Estranhamente!…

::A LER:: RTP: Caso Dreyfus português chega à AR pela mão da neta do capitão afastado em 1937 / Rabino de Israel acredita que Barros Basto vai ser reabilitado / LUSA: Caso Dreyfus português chega hoje à AR pela mão da neta do capitão afastado em 1937

Reabilitação do capitão Barros Basto II

Capitão Barros Basto

Barros Basto: Vice da bancada do PSD garante lutar pela reabilitação do militar expulso em 1937

Porto, 14 out (Lusa) – O vice-presidente da bancada parlamentar do PSD, Carlos Abreu Amorim, garantiu à Lusa que irá lutar até que o parlamento se pronuncie pela reabilitação do capitão Barros Basto, vítima de antissemitismo em 1937.
“Vou levar o caso até ao fim e só vou parar quando houver a reabilitação total a título póstumo”, disse à Lusa o social-democrata, admitindo já ter colocado o assunto na direção do grupo parlamentar do partido que lhe deu plenos poderes para agir.
Foi em 1937 que o Conselho Superior de Disciplina do Exército decidiu pela “separação do serviço” do capitão Arthur Carlos Barros Basto por considerar que não possuía “capacidade moral para prestígio da sua função e decoro da sua farda”.
Em causa estava a realização de operações de circuncisão a alunos do Instituto Teológico Israelita do Porto, que havia fundado, e a saudação com um beijo dos mesmos alunos, à maneira dos judeus sefarditas de Marrocos.
Carlos Abreu Amorim considera que o capitão foi vítima de “antissemitismo puro” e que contra ele “fizeram acusações forjadas”.
Perante a “ignomínia cometida” contra o capitão, falecido há 50 anos, o deputado quer agora que o parlamento português “se pronuncie pela reabilitação e correção plena dessa enorme injustiça e vergonha cometida contra Barros Bastos, por motivos antissemitas”.
Ainda sem saber qual será o caminho a seguir, garante apenas que irá procurar “integrar todos os grupos parlamentar” no assunto uma vez que “não pode haver políticas partidárias” pois “é uma vergonha que afeta a todos”.
O processo de 1937 está a neste momento também a ser traduzido para inglês a fim de ser endossado à Liga Anti-Difamação e à Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância após o que, e no final do mês de outubro, a neta de Barros Basto irá dirigir à Assembleia da República um pedido de reintegração do avô, a título póstumo.
Para o efeito conta com o apoio de instâncias internacionais e do bastonário dos advogados, Marinho Pinto, que já exigiu a reabilitação do capitão cuja sentença considerou uma “ignomínia”.

::A LER:: Caso Dreyfus português pode ser resolvido 70 anos depois com o apoio de Marinho Pinto / Caso chega à Assembleia da República: Família indemnizada por anti-semitismo / Judeus pedem reabilitação de militar “imoral” / La presse portugaise passe à coté des déclarations du Bâtonnier des avocats sur “l’affaire Dreyfus portugais”. Marinho Pinto exige la réhabilitation de militaire juif (Fr.) / 50 Anos do Falecimento do “Dreyfus Português” / VISÃO: O Apóstolo dos Marranos

Marinho Pinto exige reabilitação de militar judeu

foto de Miguel Pereira

Texto de Óscar Queirós

O bastonário da Ordem dos Advogados exigiu em Trancoso a reabilitação de Barros Basto, um oficial que em 1937 foi “separado” do exército português por ser judeu. Sem salário e sem direito a assistência social, o militar vítima do antissemitismo da instituição militar, acabaria por morrer na miséria em 1961.
“Esta sentença é uma ignomínia a que a Assembleia da Republica deve pôr cobro. Todos nos devemos sentir sefarditas, judeus, até que seja feita justiça ao capitão Barros Bastos”, afirmou Marinho Pinto a propósito da decisão de 1937 do exército português, até hoje nunca revogada, de o afastar da instituição militar, “sem direito algum, nem sequer a um processo justo”. Estas declarações do bastonário da Ordem dos Advogados foram feitas durante a sua intervenção, como convidado, no Convento dos Frades, em Trancoso, no âmbito do II Festival Internacional da Memória Sefardita que decorreu entre 18 e 21 de Setembro em Belmonte, Guarda e Trancoso. Marinho Pinto, que fez questão de frisar ser agnóstico mas defensor acérrimo da liberdade de culto, “explicou” o facto de “74 anos depois da infame decisão”, o capitão Barros Bastos ainda não ter sido reabilitado: “porque a Inquisição subsiste ainda em Portugal”.
O bastonário, conterrâneo do capitão que o Exercito considerou “imoral” – ambos nasceram em Amarante -, manifestou a sua “inteira disponibilidade, como bastonário dos advogados e como cidadão” para “lutar que justiça lhe seja feita”. Este caso “é uma vergonha para Portugal”, um país que, onde, “ainda hoje”, disse Marinho Pinto, “nem todas as religiões têm os mesmos direitos e as mesmas garantias”.

photo by Miguel Pereira

Marinho Pinto demands the rehabilitation of Jewish military officer

By Óscar Queirós

The President of the Portuguese Bar Association demanded the rehabilitation of Captain Artur Barros Basto, a Jewish military officer who in 1937 was “separated” from the Portuguese army for being Jewish. As a result the military officer, victim of antisemitism in the military, lost his pay as well as his right to social assistance, eventually dying in poverty in 1961.
“This ruling is a disgrace the Parliament needs to correct. All of us should feel as Sephardim, as Jews, until justice is done to Captain Barros Basto” Marino Pinto said, commenting the 1937 decision from the Portuguese Army which until the present day has never been corrected or overturned, a decision “without any rights whatsoever or even with a fair trial”. These statements by the President of the Portuguese Bar Association were made recently during his speech at the Convent of the Friars, in Trancoso, Portugal, at the II International Festival of the Sephardic Memory, held last September in Belmonte, Guarda and Trancoso, in Portugal. Marinho Pinto, who was keen to stress that while he is an agnostic he is a staunch supporter of religious freedom, “explained” the fact that “after 74 years after the infamous decision,” Captain Barros Basto has not yet been rehabilitated, “because the Inquisition still exists Portugal.” The President, born in the same town as Captain Barros Basto – Amarante – said that the Army considered the captain “immoral”, and expressed his “full availability, as the President of the Bar Association and as a citizen” to “fight until justice is done.” This case “is shameful for Portugal,” a country where even today, Marino Pinto said, “not all religions have the same rights, or the same guarantees”.

::A LER:: A Noite de Shabbat, ou a Arqueologia das Pequenas Felicidades / Barros Basto – um artigo de Inácio Steinhardt

Leitura Obrigatória


O Trompete de Miles Davis, o belo romance de estreia de Francisco Duarte Azevedo, já está à venda nas livrarias, com chancela da Planeta Manuscrito. Tive o prazer (acho que será mais privilégio do que outra coisa qualquer) de acompanhar de perto a evolução do livro. Chamar-lhe-ia mesmo manufactura — o Francisco é dos poucos escritores a quem a palavra “manuscrito” se aplica ainda em sentido literal, porque a escrita lhe sai directamente do punho para uma resma de pequenos cadernos, antes de ser depurada com minúcia ao teclado do computador.
Já aqui escrevi sobre ele há uns anos, ainda o livro estava muito longe da versão final que agora se pode encontrar nos escaparates. Sobre ele escreve agora Lídia Jorge:

Porque me comove O Trompete de Miles Davis? Porque é um livro que alcança muito mais do que pretende e atinge muito mais longe do que anuncia. Porque, nesse desprendimento, nos entrega figuras que nunca mais se afastam do nosso pensamento. Um primeiro livro que parece ser o sexto.”

A apresentação oficial é feita dia 15 de Março, terça-feira, às 18h30, no Salão Nobre do Instituto Camões, em Lisboa (Avenida da Liberdade, 270, ao Marquês de Pombal). Lídia Jorge faz a apresentação. Anotem, por favor. É leitura obrigatória.

Um crime inqualificável


Udi Fogel, (37 anos), Ruth Fogel (36 anos), e os seus filhos Yoav (10 anos), Elad (4 anos) e Hadas (3 meses), foram assassinados sexta-feira à noite, enquanto dormiam. O crime foi cometido por um terrorista palestiniano das “Brigadas de Al-Aqsa” (ver Al Aqsa Brigades claims responsibility for West Bank killing).
A brutalidade deste massacre deixa-me perplexo. Um leitor desatento poderá interrogar-se como será possível que alguém possa alguma vez considerar sequer a possibilidade de degolar uma pessoa, quanto mais uma família inteira; quanto mais uma criança de dez anos, e outra de quatro e ainda uma bebé de três meses. Mas um observador atento lê a descrição do massacre num site palestiniano (“traduzido” para português via Google) e compreende que a linguagem efusiva e as felicitações ao autor do crime apenas são possíveis numa sociedade que desumaniza “o outro”, que justifica e incita qualquer acto de terror contra qualquer israelita (bebés de três meses incluídos).
Quem lê este blogue sabe onde me situo e saberá, por certo, que sempre defendi e defenderei a necessidade da paz. Mas, honestamente, como se pode falar de paz com alguém que olha uma bebé de três meses nos olhos para depois a degolar?
Alguns virão lembrar que a Autoridade Palestiniana condenou o massacre. E que o Hamas negou qualquer envolvimento. Mas é a passividade (para não dizer pior) dos primeiros e o acicate constante dos últimos que mantém em lume brando o ódio extremo e a cultura de morte que permitem que uma família de cinco pessoas seja degolada enquanto dorme. E não me venham dizer que ser colono ou deixar de ser colono pode constituir uma justificação qualquer que atenue a gravidade do crime. Porque quem assim pensar estará muito próximo do nível de quem o perpetrou.

Petição pela restituição da nacionalidade portuguesa aos judeus sefarditas portugueses

Os judeus sefarditas foram expulsos de Portugal ou forçados ao exílio a partir das perseguições de finais do século XV, continuando a considerar-se e a referir-se a si mesmos como “judeus portugueses” ou “judeus da Nação portuguesa”.

Presentemente, constituem um grupo pequeno, tendo alguns membros cidadania israelita, sendo que a maioria vive no Brasil na maior parte do tempo e correspondendo quase todos a indivíduos com educação de nível superior, em geral profissionais liberais e que, na maioria, falam mais do que o português.

Há muitos judeus sefarditas que aspiram a recuperar a nacionalidade portuguesa, de que se encontram privados mercê da expulsão e/ou exílio forçado dos seus antepassados.

A Espanha – que fez expulsões similares às ocorridas em Portugal – já adoptou legislação, desde 1982, que permite a naturalização dos judeus sefarditas de origem espanhola ao fim de dois anos de residência em Espanha, à semelhança da norma aplicável a um conjunto limitidado de origens específicas. E, em 2008, adoptou a possibilidade por “carta de natureza” e atribuiu a nacionalidade espanhola, independentemente de residência, a judeus sefarditas, mercê unicamente de um conjunto de indicadores objectivos (apelidos, idioma familiar) e competente certificação pelo rabino da comunidade.

Os judeus sefarditas interessados em recuperar a nacionalidade portuguesa sublinham que outros países, como a Grécia, já adoptaram legislação de reaquisição de nacionalidade por judeus expulsos e seus descendentes e que a própria Alemanha o fez, face à tragédia mais recente.

Portugal é dos poucos países, senão o único, que não dispõe de normas para reaquisição de nacionalidade pelos descendentes de judeus expulsos.

Assim sendo, nós, cidadãos portugueses, através dos signatários desta petição, vimos solicitar perante os Poderes constituídos da República Portuguesa , a restituição da nacionalidade portuguesa aos judeus sefarditas portugueses.

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O pintor Baruch Lopes de Leão Laguna, judeu de ascendência portuguesa, considerado um dos mais representativos retratistas dos finais do século XIX e da primeira metade do século XX, foi assassinado pelos nazis em Auschwitz, a 19 de Novembro de 1943. A nacionalidade portuguesa podia ter-lhe salvo a vida.

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